Em seu novo artigo, o gerente de conteúdo da Geekie, Érick Nascimento, fala sobre a importância de preparar profissionais para a sucessão em lideranças. Uma atividade que demanda tempo e acompanhamento constante, mas que evita buracos na gestão após uma troca do ou da líder
Eu preciso confessar: não sei nadar. Essa não é uma confissão fácil nem algo que eu incentivo, mas é a verdade. Entro na água e vou direto para o fundo. Como se já não fosse o bastante, não consigo carregar mais do que 15 kg de qualquer coisa, se corro mais de 500 metros fico ofegante, não sei jogar futebol e não tenho a menor capacidade motora para lidar com nenhum instrumento ligado à atividade física.
Faz uns dias, um amigo decidiu correr no parque três vezes por semana, e isso me deixou sequioso por fazer o mesmo, com um detalhe: com ele. Fiquei intrigado do motivo de, após mais de 30 anos sem fazer atividade física, eu ter vontade de fazer alguma coisa, só porque um amigo também ia fazer.
Em assunto relacionado, dia desses eu estava numa reunião de trabalho aqui na Geekie e um colega “rato” de academia perguntou ao outro se ele tinha decidido contratar o personal trainner que ele tinha indicado. O outro disse que sim e que já estavam treinando juntos desde a semana passada. O primeiro disse: “eu não consigo mais treinar sem ele”. Nessa mesma reunião, em 5 momentos diferentes foi falado sobre acompanhamento de pessoas dos times e foi aí que me surgiu essa vontade de registrar este texto.
O desafio de fazer acompanhamento constante
O ser humano é um ser social por natureza. É curioso como, naturalmente, queremos encontrar pessoas com os mesmos interesses que nós. Isso não exclui nossas necessidades de estar sós de vez em quando, mas ratifica a necessidade de sempre termos pessoas que se tornam referências para nossas atividades, seja de forma íntima (como eu e minha sutil vontade de correr com meu amigo), seja de forma profissional (como meu colega e seu personal trainner).
Em ambos os casos exemplificados, o interesse foi da pessoa que estava em fase de desenvolvimento, e não da pessoa que já estava desenvolvida. Isso quer dizer que a necessidade no nível informal é “de baixo para cima”. O mesmo, entretanto, nem sempre acontece em nível profissional. Líderes (em comparação com as pessoas desenvolvidas) é que precisam se responsabilizar e correr atrás de quem está sendo liderado para desenvolver essas pessoas. Gestão passa por isso.
Trazer liderados e lideradas para perto e fazer acompanhamento constante é um desafio urgente, especialmente quando se fala de dedicação de tempo. Líderes, em geral, têm muitas responsabilidades que exigem tempo e esforço dedicado e exclusivo. As pessoas parecem que devem ser contratadas para executar o serviço para o qual foram chamadas, mas por vezes demonstram uma carência, um nível de dependência e de pouca autonomia que pode irritar, se o foco da liderança estiver errado.
Existe sucessão para você?
Líderes, gestores e gestoras precisam dedicar tempo para as pessoas, responsabilizar-se por elas, querer que elas melhorem, evoluam e se desenvolvam. Se não dedicarmos tempo aos liderados, teremos times medíocres ou pouco evoluídos. Não é isso que queremos. Queremos times autônomos e pró-ativos, mas isso só vai acontecer se houver tempo focado nas próprias pessoas; sentar com elas periodicamente, ouvi-las, entender seus potenciais, sonhos, limitações, margem de crescimento.
Quando se fala disso no ambiente escolar, é fácil perceber o desafio. Em linhas gerais, estudantes são responsabilidade de docentes, que são responsabilidade de coordenadores e coordenadoras que são responsabilidade de diretores e diretoras. Simples? Não mesmo. Todo mundo sabe disso, mas necessário. Focando aqui em direção e coordenação, a pergunta que quero deixar para reflexão é: existe sucessão para você? Quem assume sua função caso você precise sair para uma emergência? Você consegue confiar completamente nessa pessoa para tomar decisões no mesmo nível que você tomaria?
Esse tipo de confiança com nível de responsabilização semelhante só se atinge com convivência. Qualquer que seja o nível de gestão, inclusive a escolar, precisa ter alguém para suceder e a sucessão adequada só é alcançada quando se tem alguém ao seu lado em quem você confia, acredita e aposta. A conversa constante, o alinhamento, a orientação, a delegação farão com que você atinja esse nível de confiança com o tempo; e mais uma vez ele aparece aqui: o tempo.
O fator tempo e o desenvolvimento da sucessão
Dedicar tempo para alguém é dedicar parte da sua vida a outra pessoa. Em gestão, isso é indispensável. Há quem diga que o número ideal de pessoas para gerir é, no máximo 5, portanto é indispensável haver níveis de gestão, com responsabilidades gradativamente diferentes. Entre esses 5, deve haver aquele ou aquela que você considera como sucessão. Inevitavelmente, essa pessoa precisará de ainda mais do seu tempo, ainda que, eventualmente, você precise falar o óbvio.
Na minha experiência como gestor, aprendi que quando você está começando a cansar de falar a mesma coisa é quando as pessoas estão começando a ouvir. No caso de alguém para sucessão, essa fala precisa ser pró-ativa, para que não se caia no erro que eu cometi de chegar até a idade adulta sem o mínimo de condicionamento físico, por não ter tido quem me orientasse, quem me incentivasse, quem me indicasse o caminho para um esporte que iria não só me fazer bem fisicamente, mas também poderia me beneficiar mentalmente. Foi preciso um amigo fazer para eu querer segui-lo. Meu colega precisou de um personal trainner para poder ter o incentivo.
Na sua escola, quem precisa de tempo seu? Quem são as pessoas que você lidera diretamente e que podem dividir suas responsabilidades? Você está conversando com elas periodicamente? Ou está apenas passando ordens e direcionamentos que se resumem ao trabalho? Quem é a pessoa que sucederá você?
Como educadores e educadoras que somos, ajudamos a moldar a mente de jovens para o hoje e para o amanhã. Será que estamos conseguindo ser educadores-gestores e educadoras-gestoras para nossos liderados e lideradas? Ou será que tem gente no seu time que ainda hoje não “sabe nadar”? Fica aqui um convite saudável para você marcar meia hora de conversa informal com cada um de seus liderados diretos. Hoje é o dia de você começar a formar sucessão.
* Érick Nascimento é formado em Letras pela UFC e tem mestrado em Literatura Comparada pela mesma instituição. Após anos de experiência na sala de aula, na qual atuou desde o Ensino Infantil até o Ensino Superior, tornou-se coordenador pedagógico-editorial em um sistema de ensino. Atualmente, gerencia o time de conteúdo do Geekie One.
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