Há gestores(as) que percebem uma grande motivação de docentes durante formações continuadas, mas a teoria nem sempre chega até estudantes por meio das práticas em sala de aula. Minha atuação como líder da Consultoria Pedagógica do Geekie One me fez refletir sobre o motivo disso e a conclusão que compartilho aqui está estruturada em três pilares fundamentais para essas formações de professores e professoras.
Lembro que em 2016, quando eu estava há uns poucos meses na Geekie, recebemos a visita do professor José Moran, um dos fundadores da Escola do Futuro da USP. Eu deveria entrevistá-lo acerca de Educação Inovadora, Ensino Híbrido e a necessidade de mudança nas práticas de ensino. Logo de início, ele disse: “isso que estamos chamando de inovação não é nada de novo. Esses temas estão aí há décadas. Eu falo disso há 30 anos e ainda não conseguimos realmente transformar a sala de aula”. Falamos da complexidade da mudança, passando pelo contexto externo, as limitações da escola e, é claro, a formação continuada de docentes.
Nos anos seguintes, como consultora pedagógica, encontrei esse mesmo receio incontáveis vezes. Ao começarmos uma parceria e traçarmos os objetivos e trilhas formativas da escola, um diretor comentou, frustrado, que não acreditava mais em cursos e oficinas para sua equipe.
“Fazemos todo ano, mas entra por um ouvido e sai pelo outro”. “No dia da formação, ou na semana seguinte, todo mundo sai motivado; mas, com o tempo, voltam para sua zona de conforto”.
Por que nem toda formação docente é eficaz em promover mudanças?
Já adianto que este não é um texto de culpabilização de professoras e professores. Raramente encontramos docentes que não busquem a melhoria contínua, que não estejam constantemente comprometidos com a aprendizagem e com fazer o melhor para suas alunas e alunos.
Por que, então, nem sempre conseguimos enxergar os resultados de nossos encontros – todo aquele trabalho sobre Competências e Habilidades; as palestras sobre Aprendizagem Ativa; as discussões sobre protagonismo de estudantes e o papel de mediador(a) – no longo prazo, de forma concreta e mensurável em nossas escolas?
Selecionei três pilares que, nas minhas leituras e experiência, são essenciais para promovermos mudanças reais na sala de aula:
Homologia de processos
A homologia de processos é uma premissa na Geekie. Se acreditamos nos benefícios de abordagens ativas, rotinas de pensamento e autonomia de estudantes, essa é exatamente a vivência que queremos proporcionar às nossas professoras e professores parceiros.
Por mais que uma base teórica sólida seja importante, é essencial pensar momentos da formação, em especial os coletivos, para que participantes possam experimentar na pele o que está sendo proposto, tanto da perspectiva de educadores(as) quanto no papel de estudantes.
De que outra forma vão desenvolver a convicção necessária para mudar sua prática, cujos resultados já conhecem muito bem? Por que abririam mão da segurança de suas abordagens atuais – que podem não ser perfeitas, mas funcionam – por algo hipotético ou invisível?
Leia também: Como apoiar a aprendizagem do adulto professor após a pandemia, por Kátia Martinho Rabelo (diretora pedagógica do Colégio Magister)
Aprendizagem proposital e significativa
As pautas formativas propostas à equipe docentes devem estar profundamente relacionadas aos desafios atuais que ela está atravessando.
Elas devem ser propositais – ou seja, conectar-se com uma necessidade, uma carência, um desafio que gostariam de superar – e significativas – ou seja, relacionadas ao seu contexto, fazendo sentido e se conectando às suas expectativas e interesses.
Em 2020, por exemplo, começamos o ano com um cardápio formativo robusto na Consultoria Pedagógica do Geekie One. Entretanto, quando a pandemia chegou, pouco importavam workshops sobre Design Thinking ou Backward Design – de repente, as necessidades de professoras e professores de todo o país eram outras. Precisamos nos adaptar rapidamente e elaborar formações que dialogassem e atendessem às dificuldades iminentes: como planejar momentos síncronos e assíncronos de aprendizagem; como acompanhar a participação e desempenho de estudantes à distância, e assim por diante.
Aprendizagem coletiva
Por fim, a aprendizagem da equipe docente é mais eficaz – e mais transformadora para o ambiente escolar como um todo – quando ela é coletiva. Sim, momentos de estudos individuais orientados por interesses próprios continuam sendo valiosos; contudo, para a escola que quer incorporar profundamente práticas inovadoras em seu DNA, é imprescindível deixar claro para toda a equipe para onde estão caminhando. Comunique:
- Qual o nosso norte e nossas expectativas?
- O que queremos desenvolver juntas(os)?
- Como faremos a formação, acompanhamento e avaliação de nossas professoras e professores?
O objetivo compartilhado proporciona à equipe docente a oportunidade de trocas em grupo sobre pautas comuns ou sobre como vencer obstáculos semelhantes, fortalecendo pontes com a sua realidade e uma construção colaborativa do aprendizado.
Além disso, deve fomentar a cultura da escola como um todo, em vez de associar a inovação a um perfil ou pessoa específica (o professor “legal” ou a professora “brava”) – pelo contrário, a transformação vem de uma compreensão compartilhada de em quais abordagens e metodologias de ensino e aprendizagem a escola acredita.
Referências para este artigo: PLACCO E SOUZA, 2006, Aprendizagem do Adulto Professor; CITY, ELMORE, FIARMAN, TEITEL, 2014, Rodadas Pedagógicas e vivências na Consultoria Pedagógica da Geekie.
*Marcela Lorenzoni é líder da Consultoria Pedagógica da Geekie, especialista em Gestão da Educação no Novo Milênio pelo Instituto Singularidades e bacharel em Comunicação Social pela PUC-PR. Antes de entrar no universo de startups de tecnologia educacional, foi professora de inglês em escolas de idiomas, escolas particulares e no exterior. É apaixonada por protagonismo estudantil, tema que discutiu no Ecosoc Youth Forum, na sede da ONU em Nova York.
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