Educadores(as): os heróis e heroínas de mil faces na pandemia

A definição de herói e de heroína foi revista à luz da pandemia. Na minha concepção, os professores e as professoras se tornaram grandes protagonistas desta empreitada humana de superar as limitações impostas pela Covid-19. Ao lado dos(as) trabalhadores(as) da saúde, os(as) educadores(as) lideraram uma jornada em prol da coletividade; à sua maneira, se rebelaram contra a impossibilidade de educar e quebraram os limites do físico para continuar, remotamente, uma missão tão grande quanto a própria vida: educar as novas gerações.

Da maneira do herói e da heroína mitológicos, os(as) docentes extrapolaram os limites do que acreditamos ser possível; ao mesmo tempo, criaram uma nova maneira de resistência às adversidades. Se antes – como Joseph Campbell descreve em O Herói de Mil Faces – a nossa visão sobre o herói e heroína humanos os dotava de “poderes extraordinários desde o momento em que nasceu ou em que foi concebido”, vemos, atualmente, o extraordinário sendo forjado no cotidiano adverso. Uma construção admirável!

Em sua jornada, o(a) professor(a) transformou os espaços domésticos – os seus e os dos(as) alunos(as) – em salas de aula. Nesse processo, aprendeu a dominar a tecnologia e a transformar as adversidades em formas de ensinar aos(às) estudantes o real significado da superação. No dia a dia, esteve mais próximo das famílias e responsáveis; à semelhança dos heróis e das heroínas, sentiu o desânimo e a exaustão baterem forte, mas a autodeterminação em continuar deu esperança aos demais.

Quem não se emocionou com a professora Agnes Dissmann que percorria até 60 quilômetros para levar lições impressas aos(às) alunos(as) da região de Serra da Graciosa, no Paraná? Ou com o professor Arthur Cabral que, quando soube que um grupo de estudantes estava excluído das aulas virtuais por falta de internet, subiu na bicicleta e foi levar lições até a casa deles, em uma comunidade na periferia do Recife? Ao longo da pandemia, que ainda permanece, essas histórias pouco triviais nos mostraram algo que havíamos esquecido: os educadores e as educadoras são, de fato, verdadeiros heróis e heroínas modernos(as).

Eles e elas são especialistas em vencer as muitas adversidades para além da pandemia. No Brasil, a falta de valorização desse profissional é histórica; muitos deles(as), inclusive, vivem em condições de vulnerabilidade social e econômica.

É urgente que o país passe a cuidar de quem ensina. A pesquisa A situação dos professores no Brasil durante a pandemia aponta o nível do comprometimento da saúde mental do(a) docente:

A volta às aulas presenciais se mostra um excelente momento para debatermos como vamos, como sociedade, responder adequadamente à tamanha dedicação. De invisíveis, a pandemia tornou o(a) professor(a) peça-central da resistência e da esperança do retorno à normalidade. Mas, não é mais aceitável seguirmos da forma anterior no que se refere aos(às) educadores(as).

O retorno às aulas presenciais se mostra um momento de redescoberta da afetividade entre docentes e alunos(as). Se nos últimos meses a relação do(a) professor(a) era com as imagens que substituíram as câmeras fechadas, agora o olho no olho volta ao centro do processo de ensino e aprendizagem; o (re)conhecer o(a) aluno(a) ganha um novo propósito – a voz, as expressões, o jogo corporal se ressignificam e contribuem para a superação de um tempo obscuro, inesperado e cheio de desafios.

Espero que essa conexão também seja reforçada entre famílias e docentes pela via do afeto. Que elas se tornem aliados(as) nesta luta que o professor e a professora têm empreendido por reconhecimento. Os educadores e as educadoras, pela dedicação à sociedade, são muito mais do que atores e atrizes sociais ou profissionais. São protagonistas de uma revolução que precisamos implementar na forma de aprender e de ensinar. Essa é uma peça-chave para que o país siga em direção a outro patamar de civilização.  

Por último, para adicionar a essa reflexão – que espero inspirar com este artigo –, gostaria de agradecer como cidadão e como um profissional que vivencia diariamente a educação. Que esse retorno às aulas e essa nova trajetória que se inicia sejam pautados pelo respeito, pela afetividade e por novas formas de conexão respeitosas. Para além disso, vale incluir aqui o potencial da tecnologia com intencionalidade pedagógica para a rotina de educadores e educadoras e suas relações com toda a comunidade escolar. Devemos aproveitar a maior inserção dela nas instituições de ensino para acompanhar cada estudante em tempo real, otimizar as rotinas de todos(as) que se envolvem nessa missão especial que é educar, dar mais tempo para o olho no olho, aproximar diálogos e permitir que o processo de ensino e aprendizagem vá muito além do modelo tradicional que até hoje marca as escolas e as gerações de estudantes que por elas passam.

Professor e professora, aqueles(as) que trabalham na Geekie, em nossas escolas parceiras e nas redes pública e privada do país, obrigado por nos ensinar tanto nessa jornada.

Claudio Sassaki é mestre em Educação pela Stanford University; graduado em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de São Paulo (USP) e cofundador da Geekie, empresa referência em educação com apoio de tecnologia no Brasil e no mundo.

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