Folclore: como explorar o tema de forma significativa em sala de aula

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Riqueza e diversidade da cultura popular brasileira podem ser trabalhadas durante todo o ano na escola. Confira sugestões. 

No dia 22 de agosto, comemoramos o dia do folclore. Para além do trabalho com lendas e cantigas populares, a data é uma boa oportunidade para explorar com os(as) alunos(as) a riqueza e a diversidade da cultura popular brasileira e mostrar que o folclore é algo vivo, produzido até hoje, e que faz parte do nosso dia a dia. A abordagem da temática não deve se restringir à data comemorativa e pode acontecer ao longo de todo o ano letivo. 

Nayre Carolina Gomes Luz, mestre em História e editora de conteúdo do componente curricular para os anos iniciais do Ensino Fundamental da Geekie Educação, lembra que “folclore” é uma palavra traduzida do inglês folk (povo) e lore (saber). “Assim, o termo se refere ao conjunto de manifestações artísticas, culturais, literárias, musicais, saberes, superstições etc, de um determinado povo”. 

A editora, que também já atuou como professora da rede pública de São Paulo, explica que, segundo a perspectiva de estudiosos do tema, o folclore apresenta um caráter dinâmico já que pode sofrer adaptações e reelaborações para cumprir funções no presente.

“Ao demonstrar aos(às) estudantes que a cultura popular é viva e, portanto, está sempre sujeita à interação com o tempo e com a sociedade contemporânea, eles(as) podem sentir-se pertencentes a um determinado grupo social. E também serem sujeitos ativos da cocriação de uma determinada cultura que, apesar de apresentar uma tradição, também está sujeita a novas contribuições, numa relação dinâmica de reciprocidade”, afirma.

BNCC e Carta do Folclore Brasileiro

Ao mencionar conhecimentos historicamente construídos, assim como valorizar, fruir e participar de diversas manifestações artísticas e culturais, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) toca em pontos que se relacionam ao estudo da cultura popular e do folclore. Isso está presente, por exemplo, nas competências gerais da Educação Básica: 

  • Competência 1- Valorizar e utilizar os conhecimentos historicamente construídos sobre o mundo físico, social, cultural e digital para entender e explicar a realidade, continuar aprendendo e colaborar para a construção de uma sociedade justa, democrática e inclusiva.
  • Competência 3- “Valorizar e fruir as diversas manifestações artísticas e culturais, das locais às mundiais, e também participar de práticas diversificadas da produção artístico-cultural.

“Ao discutir sobre a composição étnica da população brasileira ou explicar a realidade a partir de diferentes pontos de vista, é possível desenvolver nos(as) estudantes a capacidade crítica de compreensão do meio onde se vive”, exemplifica a editora. “E ao valorizar e participar de manifestações artísticas e culturais, os(as) alunos(as) também têm a possibilidade de sentirem-se pertencentes ao grupo social (ou aos grupos sociais) do qual fazem parte e contribuírem para a construção de uma sociedade mais democrática e inclusiva”, completa.

Mas, muito antes da BNCC, a importância de trabalhar esses aspectos na escola já estava presente na Carta do Folclore Brasileiro, elaborada em 1951 a partir das discussões iniciadas por intelectuais da época, como Mário de Andrade,  Heitor Villa-Lobos e Câmara Cascudo. O documento, revisto em 1995, já fazia referência à valorização dos conhecimentos dos(as) estudantes e da interdisciplinaridade e previa: 

  • Considerar a cultura trazida do meio familiar e comunitário pelo aluno no planejamento curricular, com vistas a aproximar o aprendizado formal e não formal (…)
  • Envolver os educadores de diferentes matérias em torno do folclore, considerando-o um amplo campo de ação para os estudos e a prática da multidisciplinaridade.

Abordagens em diálogo com a vida dos(as) estudantes

As manifestações populares são carregadas de história, memória e religiosidade, assim como de tantos outros elementos que fazem parte da cultura de um povo. Desse modo, diz Nayre, elas ressaltam a importância e a contribuição de diferentes povos e culturas que ajudaram a formar a nossa identidade. “Essas lendas, cantigas e festas também mostram que existem diferentes maneiras de se relacionar com o meio em que se vive, possibilitando que os(as) alunos(as) possam exercer o respeito a outras culturas e seus modos de organização”, ressalta. 

“Ao conhecer a lenda do guaraná, é possível trabalhar inúmeros aspectos da cultura de determinados povos indígenas da Amazônia, como a religiosidade e a flora local. Ao brincar com a festividade do Boi-bumbá, os(as) estudantes podem se deparar com a história local de regiões do norte e nordeste do Brasil e maneiras encontradas pelos povos indígenas e africanos de manterem vivas suas tradições religiosas, mesmo em um contexto de submissão imposta pelos portugueses, durante o período da colonização no Brasil”, sugere a educadora. “Também é possível explorar as migrações de pessoas da região Norte para outros estados do Brasil e a festa típica do Boi-bumbá levada por esses grupos ao se deslocarem. Atualmente, a festividade faz parte do calendário de várias cidades, fomentando o turismo local”.

Outro ponto que pode ser destacado é o diálogo que há entre aspectos da cultura popular e da considerada erudita. “Quando iniciou suas pesquisas com músicas folclóricas brasileiras durante a década de 1930, o maestro e compositor Heitor Villa-Lobos incorporou temas indígenas em suas obras, tidas como clássicas até os dias atuais”, aponta.

Educação Infantil

O eixo norteador do estudo sobre o folclore nessa etapa é a terceira competência geral da Educação Básica da BNCC, que se refere à construção da identidade do(a) estudante, habilitando-o(a) a compreender a própria cultura e a de outros povos e incentivando-o(a) a valorizar e a criar arte e cultura. 

A abordagem também deve estar alinhada aos direitos de aprendizagem e desenvolvimento na Educação Infantil – conviver, brincar, participar, explorar, expressar e conhecer-se –  e aos campos de experiência (como “o eu, o outro e o nós”) da BNCC.

“Trabalhamos cantigas de roda, musicalidade, brincadeiras, adivinhas e atividades artísticas para representar algo daquela cultura regional. E Textos curtos para contação de histórias e breves explicações para que os(as) estudantes entendam a origem da tradição regional que é passada de geração em geração”, conta Juliana Pavoni, pedagoga e editora de conteúdo de Artes e Língua Portuguesa para os anos iniciais do Ensino fundamental na Geekie Educação.

Anos iniciais do Ensino Fundamental

Nesse ciclo, o folclore pode ser apresentado como uma importante ferramenta de conhecimento da cultura popular brasileira e sua relação com a história e a memória de determinados grupos sociais.  Nayre cita alguns exemplos de como o tema é trabalhado na Geekie One, plataforma de educação da Geekie.

No capítulo “Os costumes de onde eu moro”, do 1º ano, do componente de História (geekie.one/h103), são abordadas inúmeras festividades brasileiras. Nesse contexto, é possível apresentar as suas características, assim como explorar a noção de pertencimento aos grupos sociais dos quais os(as) estudantes fazem parte.

Ainda em História, o capítulo “O impacto da tecnologia em nosso cotidiano”, para o 3o ano (geekie.one/h308), traz o tema da escravização de povos africanos e apresenta a origem da capoeira e os instrumentos utilizados nas rodas. Os(as) alunos(as) se dividem em grupos para cantar a tradicional canção “Marinheiro só”. “Eles(as) são estimulados(as) a perceber a contribuição dada pelos povos escravizados à nossa cultura, trabalhando aspectos artísticos da história e da memória do Brasil”, salienta Nayre. 

Em Artes, o capítulo “Festas populares do Brasil”, do 4o ano, apresenta a folia de reis, explorando a relação com a religião cristã e a história dos estados de Minas Gerais, Espírito Santo e Goiás. “Os(as) estudantes são levados a refletir sobre a permanência dessa festa e sua importância para os grupos que se dedicam por dias e dias para a sua realização. Assim, é possível estabelecer paralelos com as experiências dos(as) alunos(as), buscando investigar o que os(as) mobiliza a participar de determinados grupos sociais (escolar, familiar, de amigos etc) e como eles(as) se sentem ao integrar uma festividade com a qual se identificam identitariamente”, comenta a educadora. 

Anos finais do Ensino Fundamental

Na última etapa do Fundamental, é possível abordar o folclore brasileiro relacionando-o às manifestações culturais dos povos presentes em nossa formação social. A habilidade EF06HI08 [Identificar os espaços territoriais ocupados e os aportes culturais, científicos, sociais e econômicos dos astecas, maias e incas e dos povos indígenas de diversas regiões brasileiras], por exemplo, prevê o diálogo a respeito das práticas dos povos originários do Brasil. 

“É importante frisar que a cultura popular brasileira não é autóctone, mas um amálgama de tradições vindas de diferentes partes do globo, que se combinaram em uma configuração completamente heterogênea. E esse folclore ganha diferentes nuances de acordo com a regionalidade, de forma que uma mesma narrativa pode sofrer influências de sujeitos históricos locais”, diz Larissa Vianna, mestranda em História e editora de conteúdo desse componente curricular para os anos iniciais do Ensino Fundamental na Geekie Educação.

Ela acrescenta que a habilidade EF08HI20 [Identificar e relacionar aspectos das estruturas sociais da atualidade com os legados da escravidão no Brasil e discutir a importância de ações afirmativas] também traz essa temática. “Ela levanta a interculturalidade derivada dos processos imigratórios nas diferentes regiões do Brasil no século XIX”, finaliza.

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