Americano diz que universidade forma ‘ovelhas’, não líderes

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Formar líderes é o discurso da moda no mundo hoje. Mas é um discurso vazio, que contribui para educar “ovelhas”, pessoas sem autonomia ou espírito crítico.

A análise provocadora foi feita no sábado pelo escritor americano William Deresiewicz em palestra no Gate 2015, evento do Student Travel Bureau que divulgou universidades americanas e programas de intercâmbio. “O discurso de liderança é um eufemismo para prestígio, status, sucesso, para tornar os estudantes vencedores, não gente que pensa, e para garantir que, felizes ou não, sejam parte da elite”, disse. “Há programas, seminários, gurus, coaches com o objetivo de formar líderes. Mas ninguém parece saber o que é liderança.”
Ex-professor de Yale e Columbia, Deresiewicz não poupou as elogiadas universidades americanas pelo quadro que descreveu. “Elas são pontas-de-lança de um sistema global que não está preocupado em fazer os estudantes pensarem, mas em treiná-los para ser pessoas bem-sucedidas em Finanças, Engenharia, Medicina e Direito”, disse. Desde 2008, Deresiewicz visitou 20 campi, entre eles os de Harvard, Yale, Stanford e Brown, e se corresponde com alunos, professores, reitores e empresários que empregam os estudantes dessas universidades. “É um clichê dizer que Harvard é para líderes”, garantiu. “Liderança inclui qualidades morais, de caráter, não se aprende na escola.”
Para o professor, o processo de admissão nas universidades dos Estados Unidos, mas também em Cingapura, na Coréia, na Índia e até no Brasil contribui para distorções – Deresiewicz brincou dizendo que, na acirrada briga por vagas, logo haverá um “checklist da infância”. “Os jovens aprendem a dar aos adultos o que eles querem, criam uma persona, uma imagem que eles podem marquetear para as escolas”, disse. “Aprendem a ser cínicos e a trapacear.”
Deresiewicz disse que, nesse processo de subordinação aos desejos dos pais, os estudantes aprendem a esconder da família dúvidas, inseguranças e seus sentimentos. Acabam caindo em quadros de ansiedade, medo, depressão, vazio, isolamento. “Em Yale, metade dos alunos usa o serviço de saúde mental da universidade”, disse.
O resultado disso tudo é uma geração que não tem pensamento autônomo. “Eles não têm tempo de ir atrás das suas curiosidades. Não estão lá para se dedicar à reflexão”, disse o professor. “Foram ensinados a responder a nossas perguntas, não a criar seus próprios questionamentos.”
Embora tenha brincado afirmando que seu negócio é reclamar, não apresentar soluções, Deresiewicz propôs um modelo centrado nas Liberal Arts como meio de ajudar os estudantes a pensar por si próprios. No Brasil, Liberal Arts são costumeiramente traduzidas como Humanidades, mas o campo delas é bem mais amplo, inclui ciências, como física, e ciências sociais, como antropologia.
“Liberal Arts compreendem todas as disciplinas nas quais o saber é perseguido pelo próprio saber. Não se pergunta o objetivo daquilo ou sua aplicação prática”, disse Deresiewicz. “O objetivo não é aprender informação, não é uma engenharia de transferência de dados do professor para o aluno.” Para o professor, a vivência de Liberal Arts pode dar ao estudante a noção de que não existe informação strictu sensu, mas argumentos – ele citou como exemplo as grandes teorias científicas, como a da Relatividade. “Simon Schama (historiador da arte britânico) diz que a faculdade serve para aprender que as coisas que sabemos são muito mais incertas do que imaginávamos.”
Deresiewicz garantiu que sua proposta é factível e as Liberal Arts estão valorizadas no mercado, justamente pela capacidade de formar pessoas com capacidade de pensar por elas mesmas. “Conversei com 318 empregadores e 98% deles garantiram que contratariam pessoas capazes de solucionar problemas”, disse. “Você não pode ter uma educação superestruturada para uma força de trabalho desestruturada.”




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