TEDxSãoPaulo discute jogos, conexão e diversidade na aprendizagem

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Jogos no TEDxSãoPaulo

O que é o TEDxSãoPaulo?

Talvez você não saiba, mas com certeza já assistiu a alguma palestra TED, as famosas TED Talks. São conversas inspiradoras que podem apresentar desde um menino de doze anos que aprendeu sozinho a desenvolver videogames até uma modelo defendendo que aparência não é tudo. Os assuntos passeiam por temáticas das mais variadas, como liderança, inovação, arte, igualdade de gênero, comportamento, tecnologia… A lista continua. O que todos têm em comum é que são trazidos por pessoas apaixonadas pelo que fazem e com vontade de transformar suas realidades; fórmula que se repetiu no TEDxSãoPaulo, evento que reuniu 3 mil pessoas no Allianz Parque na última segunda-feira (06).

TEDx são eventos de organização independente, mas que seguem o formato das TED Talks, cujo slogan é “conversas que mudam o mundo”. De acordo com o modelo, as palestras devem ser breves, não mais de 18 minutos, além de terem por hábito ser sempre muito emocionantes.

Diversidade na escola

No evento de ontem, por exemplo, Angélica Dass entrou no palco com a pergunta: “Como vemos um ao outro?”. Seu projeto, Humanae, se dedica a encontrar as cores das pessoas, muito além da definição básica de “preto, branco, amarelo”. Segundo ela, essa não era uma questão que precisasse de discussão em sua família, em que a mãe tinha “cor de canela” e o avô era “café com leite, mas com bastante café”. Porém, se tornou questão na escola, onde percebeu que o lápis “cor de pele” era… Rosado. E ela, por acaso, não tinha pele?

O que o Humanae faz é tirar retratos de pessoas – mas muitas, muitas pessoas, do mundo todo, de idades e classes socioeconômicas distintas. Há fotos de bebês e de idosos, de alunos de escolas suíças e de favelas no Rio de Janeiro. A partir dessa fotografia em fundo branco, Angélica seleciona um quadradinho de 11 píxeis da pele do retratado, comparando a cor com as da tabela Pantone, paleta industrial comum. Tudo para questionar nossos conceitos de “raça”.


Foto do projeto Humanae, da carioca Angélica Dass, busca mostrar a riqueza da diversidade no TEDxSãoPaulo (foto: Humanae).

Não demorou para que o projeto inspirasse ações dentro da escola. Educadores de vários países replicaram o experimento com seus alunos, para que cada criança pintasse um autorretrato com seu tom de pele real. “As professoras são as melhores embaixadoras para o Humanae”, afirmou Angélica quando a encontramos ao fim da palestra, cercada por câmeras e admiradores (nós, inclusive). “Se a ideia é resolver essa questão, não podia ter lugar mais perfeito que a escola. Sempre brinco que eu só vou bater fotos, mas elas vão mudar a vida real”.

O relato de uma professora espanhola reflete essa mudança: “Depois de tanto tempo fazendo as coisas da mesma maneira, finalmente pude mostrar à minha turma a riqueza da nossa diversidade”.

Precisamos ensinar as crianças a programar


Facilitação gráfica no TEDxSãoPaulo trouxe explicações visuais das palestras.

Outro sucesso do dia foi a palestra de Camila Achutti sobre a importância da alfabetização digital. Afinal, a tecnologia se tornou uma linguagem do século 21, presente na comunicação entre amigos, no trabalho, no entretenimento, na alimentação. Mas como ela funciona?

“As nossas crianças não sabem tudo de tecnologia”, atestou Camila no TEDxSãoPaulo. “Tecnologia vai muito além de estar com o celular nas mãos durante o almoço. É preciso desenvolver senso crítico”. O que significa, por exemplo, clicar no botão “compartilhar” no Facebook? Muito mais do que um clique indica – a informação compartilhada representa opiniões, é disseminada por toda a sua rede e pode impactar quem você sequer imagina.

Aprender sobre cidadania digital e saber não apenas consumir, mas criar nas redes, é essencial ao se preparar crianças e jovens para a sociedade, assim como o era aprender história, geografia e línguas cultas no século 18. A configuração da escola está em transformação – o que implica, para Camila, não somente incluir a programação no currículo escolar. A escola deve estimular as relações e a criatividade, enquanto o papel do professor fica cada vez mais distante do detentor único de conhecimento e mais próximo do mentor que apresenta caminhos.

O que é inteligência coletiva?

Camila não foi a única a enfatizar a importância da tecnologia digital na educação. Drica Guzzi participou do TEDxSãoPaulo trazendo sua experiência com o AcessaSP, programa de inclusão digital do estado de São Paulo.

As chances de sucesso de qualquer indivíduo, conforme Drica explicou, dependem de três fatores: seu conhecimento prévio, as redes das quais ele participa e os meios de comunicação aos quais é exposto. Não precisa muito mais para entender por que promover o acesso à internet entre comunidades de baixa renda se tornou a missão da pesquisadora. Sem intervenções que garantam a inclusão, a tendência é que as informações livres da rede beneficiem apenas aqueles que já possuem um nível socioeconômico elevado – portanto, aumentando o gap entre mais ricos e mais pobres.


Drica Guzzi mostra a desigualdade de acesso à internet no Brasil – sem democratização no acesso, a desigualdade social pode aumentar.

Criar esse espaço democrático de troca de informações e construção de conhecimento é o cerne da inteligência coletiva, segundo a qual as pessoas precisam compartilhar o que sabem através de ferramentas para, através da interação, realmente aprender.

Jogar e brincar não são a mesma coisa

Tudo começou com uma dança das cadeiras em que ninguém era eliminado; ao final da dinâmica, dezenas de pessoas estavam amontoadas em um único assento. Essa brincadeira levou Rodolpho Martins a pensar na frase que mais ouvia quando criança: “Você precisa aprender a perder”. “Foi então que eu percebi que essa lógica estava errada. Que eu podia alcançar meus objetivos sem, com isso, impedir que outros alcançassem os seus”.

Muitos painéis do TEDxSãoPaulo vieram defender a brincadeira e os jogos como caminho para a aprendizagem. Fernando Tsukumo, que se apresentou no fim da tarde, prosseguiu pontuando as aprendizagens possíveis até no mais simples jogo de cartas ou tabuleiro: valorizar o erro como parte natural do caminho; compreender regras e cooperar; trabalhar por um objetivo ao mesmo tempo em que aproveita cada etapa do processo; exercitar a resiliência – ou seja, não desistir na metade, um pecado entre os jogadores (“mas sempre tem aquele primo que diz ‘ah, não quero mais brincar’, provocou Fernando).

A diferença entre brincar e jogar, explicaram os palestrantes, é que a brincadeira não exige competição, como a dança das cadeiras citada por Rodolpho. O brincar é livre, espontâneo e universal. Quem encerrou essa conversa com chave de ouro foi Renata Meirelles, do projeto e documentário Território do Brincar, que relacionou a brincadeira infantil com a busca pela identidade: “Basta observar os gestos da criança enquanto brinca. Ela pula, para crescer, ela está em movimento, ela envolve o corpo todo”, enumera Renata.

“Vejo que o século 19 foi quando começamos a ouvir a classe trabalhadora. No século 20, as mulheres. E acredito que o século 21 é finalmente quando vamos começar a ouvir as crianças”

Entretanto, é preciso dar às crianças tempo e espaço para entrar em contato com o ambiente, despertar curiosidades e desenvolver autonomia; algo que não acontece quando ela vive com a agenda lotada de cursos extracurriculares e um quarto com pilhas de brinquedos que funcionam sozinhos. O ócio, assim como o estímulo em outros momentos, é valioso e precisa ser respeitado. Esse cuidado ainda não é regra, mas a educadora percebe progressos. “Vejo que o século 19 foi quando começamos a ouvir a classe trabalhadora. No século 20, as mulheres. E acredito que o século 21 é finalmente quando vamos começar a ouvir as crianças“, concluiu.

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